"Planejamento de longo prazo não lida com decisões futuras, mas com um futuro de decisões presentes" (Peter Drucker)
O surgimento das startups fez eclodir novos paradigmas ao conceito tradicional de empresa, que não se restringe a uma mera atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços.
Há a necessidade de observar a dicotomia: empresa tradicional e negócio. Empresas tradicionais atuam com atividades comerciais já conhecidas, e possuem processos internos e organização, estoques, maquinário, funcionários e etc.
Por sua vez, nas startups, a empresa está ainda em constituição, porquanto as atenções de seus empreendedores são voltadas unicamente para a ideia de negocio inovadora, representado pelos investimentos e estudos dos seus produtos ou serviços no mercado, com o fim de apresentar uma solução concreta, com amparo nas suas habilidades mercadológicas e intelectuais.
Em resumo, as empresas da Nova Economia (Startups, empresas com modelos de negócios ágeis, etc.) costumam começar com uma ideia, ou seja, surgem – de fato, antes mesmo de sua constituição formal enquanto sociedade (registro).
Levando em consideração a lógica de bootstrapping (que significa que o dinheiro investido na empresa foi dos próprios fundadores) dessas empresas e a altíssima chance de insucesso do novo negócio, os empreendedores necessitam de instrumentos jurídicos capazes de minimizar a exposição a riscos de perda.
O memorando de entendimentos, mais conhecido como memorandum of understanding (MOU) é um documento preparatório à elaboração do registro da sociedade, de natureza pré-contratual, contendo por minúcia os interesses, as obrigações e os deveres de cada um dos seus fundadores, conforme as diretrizes do projeto.
É uma ferramenta importante aos empreendedores que desejam formalizar uma sociedade, mas que, para isso, dependem da verificação da viabilidade do negócio. Consolida o futuro contrato social da empresa e ao mesmo tempo, oferece credibilidade institucional à empresa, antes mesmo de sua constituição, como forma de atrair investidores.
Por meio deste documento ficam registradas as diversas decisões tomadas ao longo das negociações, a fim de ratificar os compromissos e as posições firmadas pelas partes e conferir segurança jurídica, possibilitando uma maior facilidade no transplante dessas deliberações para o ato de constituição da sociedade.
Neste contexto, com o avanço da tecnologia e consequente complexidade dos negócios e delongas inerentes a sua fase embrionária, o MOU bem redigido por um advogado especializado tem fundamental importância para regulação das expectativas e necessidades das partes em busca do objetivo comum, bem como a proteção de seus direitos.
O ímpeto de um novo empreendimento sem o suporte de um plano de negócios com a avaliação prévia dos reflexos jurídicos que circundam a atividade empresarial pode comprometer a curto, médio, ou longo prazo uma ideia promissora ou a respectiva estratégia negocial com possibilidade de êxito.
Por essa razão, o Memorando entre Fundadores ou Acordo de Fundadores (do inglês “Founders’ Agreement”) é um instrumento eficiente para alinhar expectativas e prevenir desentendimentos futuros que possa vir a comprometer o sucesso da sociedade.
Dessa forma, se for elaborado de forma aderente ao negócio e expectativas dos seus fundadores o MOU irá vincular as partes, ou seja, os futuros sócios, conforme inteligência do artigo 462 do Código Civil.
Associada a estas vantagens, possibilita aos futuros sócios a economia de recursos, em uma fase ainda incipiente do projeto e, caso não venha lograr êxito no estudo de sua viabilidade comercial e escalabilidade do seu produto, minora os contratempos decorrentes da manutenção ou fechamento da empresa mal sucedida.
O memorando de entendimentos não se aplica apenas ao ecossistema das startups. É um contrato preliminar de pré-constituição de sociedade e, deste modo, pode ser utilizado em diversas situações: estágio embrionário de projetos comerciais e investimentos, troca de informações em fases de negociações de operações societárias; cooperação de empresas, etc., enquanto forma de proteção jurídica ao negócio.
A assessoria jurídica é de fundamental importância à solidificação do negócio conferindo segurança jurídica a relação entre os empreendedores parceiros, com a mitigação de riscos e conflitos, tendo como principais disposições:
Considerandos (condições e intenções dos contratantes);
Descrição do Projeto;
Capital Social (Pode prever a participação de cada fundador na sociedade que será constituída);
Função de cada parte para o projeto;
Reserva de capital social para colaboradores;
Diretoria/Administração;
Deliberações (quórum para tomada de decisões contratação de parentes, cessão de quotas, e etc.)
Remuneração e Dedicação;
Confidencialidade (manter em sigilo todas as informações originárias do projeto);
Não Concorrência (fundadores não poderão ingressar em outros projetos que desenvolvam as mesmas atividades do projeto);
Não Aliciamento (proibição de persuadir as pessoas que trabalham no projeto, e também de persuadir os clientes a deixarem de fazer negócios com a parceria que está prestes a ser formada);
Evento ou Marco para que seja realizada a constituição da empresa formal; Momento ou Marco para captação de Investimento, que pode incluir o formato e regras para investimento na Startup;
Definição de Meio e momento de liquidação e venda de participação societária do sócio que desejar se retirar da startup;
Para exemplificar a sua importância prática aos empreendedores, destacamos a importância das suas disposições referente à propriedade intelectual, como forma de blindar o negócio, na fase de maturação da sociedade, como abaixo ilustrada:
“As Partes declaram que a propriedade, patente, marca, domínio, código fonte, segredos comerciais, e os direitos de exploração de conteúdo intelectual, comercial, de tecnologia e ou industrial que venham a desenvolver na condição de sócios ou meros colaboradores da Sociedade, independente de seu estágio de concepção ( inacabado, concluído) e de colaboração (parcial ou total), são e serão de propriedade exclusiva da Sociedade, não podendo a qualquer tempo exigir direitos e nem participação sobre quaisquer envolvimentos, quer seja de cunho intelectual, trabalho, conhecimento, entre outros Declaram ainda que as condições desta cláusula são as mesmas e estendidas igualmente para qualquer outra empresa ou produto investido e/ou adquirido pela Sociedade”
Os irmãos Winklevoss decidiram processar Mark Zuckerberg sob a alegação de que ele teria usurpado a ideia de criação do Facebook após os Winklevosses terem apresentado a ideia acreditando que ele faria a programação do projeto [1].
Caso os irmãos tivessem se resguardado juridicamente desde o início, por meio da proteção e segurança jurídica conferida pelo MOU provavelmente evitaria o enfrentamento judicial decorrente da “usurpação da ideia”.
O MOU é um alicerce jurídico imprescindível ao crescimento sustentável dos negócios desde a concepção de sua ideia até a fase de maturação, qual seja o registro da sociedade.
Trata-se de uma forma de minimizar os riscos e gastos aos quais os empreendedores se expõem, preservando-se a lisura, a harmonia das partes e a boa-fé objetiva inerente aos negócios. Logo, a adoção de instrumentos jurídicos que regulam e determinam a forma pela qual a relação dos empreendedores é organizada traz maior segurança ao investidor, gerando maiores chances de interesse deste pelo empreendimento e consequente formalização da sociedade com robustez jurídica.
A elaboração deste instrumento contratual evidencia a importância da advocacia preventiva, como um investimento as empresas na sua função de gerir e agregar riquezas, com a mitigação de riscos e conflitos societários, aumentando as suas vantagens competitivas no mercado.
Notas
[1] CONTEÚDO aberto. In: Wikipédia: a enciclopédia livre. Ações judiciais envolvendo Facebook - Lawsuits involving Facebook. Disponível em: https://br.wiki2.wiki/wiki/Lawsuits_involving_Facebook#ConnectU.com_lawsuit. Capturado em 31/07/2021.
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